terça-feira, 23 de abril de 2024

Amadurecer ou adolescer no terceiro ato da vida?

Estou no terceiro ato da minha vida, como diria a Jane Fonda. Fui uma adolescente e uma jovem muito imatura.Talvez por isso mesmo,e também por uma missão de vida, amadurecer tornou-se uma questão primordial na minha vida. Então, seria bom refletir aqui sobre o amadurecimento, o que seria esse amadurecimento. A primeira palavra que me ocorre é aprendizado. A vida como uma oportunidade de aprendizado. Sei que é uma palavra que utilizamos muito - aprendizado - , mas o que está contido nisso, pra não ser apenas uma palavra, dentre as muitas que usamos , belas palavras que não se tornam uma ação prática na vida? Penso que, dentro desse aprendizado estão contidos muitos outros conceitos: da compreensão do que se vive,da aceitação disso, da compreensão do porquê estarmos aqui encarnados, do porquê estarmos aqui encarnados NESSE MOMENTO ATUAL DA TERRA, da aceitação dinâmica de tudo isso, de se encarar com honestidade nos menores pensamentos e atos cotidianos, de rever suas ideias e conceitos - porque o que foi adequado um dia , pode não o ser mais - , de refletir sempre e sempre sobre o " estar vivendo isso, para que?" Penso que o "para que" nos importa mais e nos dá mais clareza do que o " por que". Porque...o " para que" nos leva ao aprendizado. Pra tudo isso, pra todo esse processo muito exigente, precisamos exercitar o auto-conhecimento , não somente quando temos grandes questões a resolver, mas , principalmente, nas pequenas questões , nos pequenos pensamentos envergonhados e vergonhosos, nos pequenos atos do dia a dia. Trazer tudo isso pro concreto, pra bem perto de nós. Impossível amadurecer sem olhar pra nossa sombra. Não somente olhar, mas conhecer os detalhes dela, sem se deixar subjugar por ela. Identificá-la sem se identificar com ela. Lembro de um texto da Mãe, qdo ela diz que " uma hora precisamos engolir a pílula , e ela é bem amarga". Temos sempre o desejo e, por vezes, a intenção explícita, de nos mostrarmos no nosso melhor ângulo. "Ah! não, nessa foto não estou bem, estou com uma cara meio amassadinha, tire outra..." Tive um amigo que brincava qdo íamos tirar foto e dizia :" façam cara de inteligentes"...Hoje, talvez, a premissa seria " façam cara de felizes e contentes"... Ok, na fotografia dá pra fazer isso, mas...e se mostrássemos como estamos no momento? E se desafivelássemos um tanto dessa máscara apertada? Talvez veríamos que não somos tão diferentes uns dos outros. Talvez veríamos a dor e o amor que todos temos dentro, com seus múltiplos desdobramentos de sentimentos. Talvez pudéssemos ver a beleza e a feiura, a bondade e a malícia, a alegria e a tristeza, o encantamento e o desânimo que habitam em cada um de nós, sem desviarmos o olhar. Porque reconheceríamos no outro o que também está em nós. Claro que tudo isso passa centralmente pela intenção de evoluir. Queremos evoluir? Ou queremos ir vivendo, reclamando do outro, reclamando da vida, sem nenhuma intenção de encarar nossas prórias deficiências e, ( escrevo entre aspas...), "defeitos", que já trouxemos nessa encarnação para transformarmos? Na nossa bagagem humana, já trouxemos muitas coisinhas negativas, nessa malinha preta .E vamos abrindo nossa mala preta! Se na mala preta do avião tá tudo lá registrado e escondidinho, na nossa também. Quem disse que evoluir é fácil? E evoluir está de mãos dadas com o transformar e amadurecer. Não vale a pena adolescer no terceiro ato, isso já passou, amigos sessentões e setentões! ... E novos seres irão encarnar já trazendo em si as sementes do Novo , já trazendo outro nível de consciência! Como ajudarão a nossa terra sofrida nesse momento de transição planetária... Lembram da porta estreita? É apertadinha, dá trabalho pra passar... Mas não há serviço mais abençoado que esse, embora difícil! E temos todas as ajudas " de lá "! Então , vamos! No leme do nosso barco, nesse grande mar de Deus, nesse grande mar da vida! Estamos a caminho! Nesse Música e Autoconhecimento, sempre sugiro uma música ao final. Hoje sugiro a Nona Sinfonia do mestre Beethoven, Divino Maravilhoso de Caetano com Gal, e filmes de Win Wenders. " É preciso estar atento e forte, não temos tempo de temer a morte" <3

domingo, 14 de abril de 2024

Limpezas da transformação...

Que trabalho nessa vida, limpar nossa casa dentro... Porque, pra limpar precisamos conhecer o que lá está. Precisamos entrar em contato com o que vamos conhecendo. Não dá pra "pular esse pedaço" de limpeza, não dá pra não sujar as mãos. E não adianta somente conhecer, ao "entrar em contato", necessariamente, sentimos. E temos todos os tipos de sentimentos dentro, dos mais lindos e arejados aos mais densos e amarrados. E como queremos sempre parecer arrumadinhos, tentamos nos esquivar dos sentimentos difíceis, dolorosos.Temos técnicas variadíssimas pra colocá-los debaixo da cama, debaixo do tapete, debaixo da terra...Gostaríamos mesmo, se fosse possível, de exportá-los pra outro planeta, que alívio!! Mas em algum momento , precisamos desenterrar e olhar o que não foi devidamente cuidado, o que ficou pra trás. Poque começa a pesar muito, torna-se um fardo impossível de carregar. Quando a vida lhe obriga a entrar em contato com esses fardos, quando coloca a coisa bem debaixo do seu nariz, por mais difícil que seja, é uma chance grande. Não queremos evoluir? Não queremos ser inteiros, íntegros, com um olhar leve e profundo? Então nos abastecemos de honestidade e muita coragem, de muita paciência conosco, de muita auto-empatia, e começamos, mais uma vez e sempre, a limpeza e organização do nosso material interno. Limpar as cavalariças de Augias dá um trabalho danado e não cheira a patchouli . É um trabalho hercúleo! Será por isso que Hércules o fez? Estamos em tempos trabalhosos e , muitas vezes, precisamos de esforços hercúleos. Quando Lobato faz a Emília estar na Grécia Antiga e acompanhar Hércules nos seus Trabalhos, devia saber um pouco sobre toda essa dificuldade, pois a Emília deu algumas mãozinhas de ajuda ao nosso herói. Mas nós, multi-hércules dos nossos tempos atuais, também temos muitas mãozinhas nos ajudando. Mãozinhas invisíveis e mãozinhas bem visíveis também. Quando viemos para essa encarnação, trouxemos um propósito bem definido, um compromisso de participar ativamente desse momento de transformação. Ao longo do caminho fomos esquecendo do ponto central da nossa encarnação, fomos nos distraindo.. .Mas já faz um tempo- e agora mais que nunca - que é momento de lembrar e assumir. " O mundo se prepara para uma grande mudança - Você quer ajudar?", pergunta a Mãe. Sim, queremos. E essa ajuda passa por essa limpeza dos sentimentos, dos pensamentos, das sensações, de tudo. É como virar ao avesso.Como diria Caetano " o avesso do avesso do avesso"... - " O ego foi o assessor, o ego é a barreira" , diz nosso querido mestre Aurobindo. Estamos exatamente no momento onde ele é barreira, interrupção para o novo, para a transformação. Nosso trabalho é com ele, ele que se agarra aos ciscos da caverna, aos infindáveis julgamentos de si e do outro, à velha máscara do zorro,apertada demais. Com nossos dedinhos alargamos ele, vamos abrindo espaços dentro, ampliando, deixando a onda do mar lavar e a luz do sol banhar, o fogo queimar o que já não serve à nossa evolução,o vento passar com suavidade caridosa e curativa, o fôlego aumentar,o olhar se aprofundar...e a dança continuar . Dance, dance, dance, senão estará perdido, disse Pina Bausch. Continuamos na dança. A vida é nossa parceira nessa preciosa dança, nada pode dar errado. Avancemos, pois. Vamos ouvir música? Vamos ouvir a Sétima Sinfonia de Beethoven , com seu maravilhoso segundo movimento da caminhada do rei gago pra fazer seu discurso. E complementamos com as canções praieiras de Caymmi, que sempre nos disse que é doce morrer no mar...

terça-feira, 19 de setembro de 2023

Revisitando Alice

Na verdade, não revi Alice agora. Mas , ao acordar, me veio uma das cenas finais do filme, onde a Rainha Branca pede perdão à Rainha Vermelha, sua irmã. E voltamos a uma das cenas iniciais do filme , onde as duas irmãs mocinhas estão no quarto e a mãe vem perguntar quem comeu a torta . A comilona foi, na verdade, a irmã mais nova, mas ela não admitiu a verdade, lançando a culpa na irmã mais velha, que sai correndo, desatinada e se sentindo tremendamente injustiçada. Ela cai e bate a cabeça e sua cabeça começa a inchar desmedidamente.E ela se torna "má". Todo o desenrolar da história se baseia nisso, nessa mentira que a "boazinha" não conseguiu admitir. Então temos os 2 lados: um , que mentiu e segurou a mentira e o outro que passa a vida se vingando da situação de injustiça a que foi submetida. No final, a Rainha Branca pede perdão à irmã, que diz : - Passei a vida esperando ouvir isso! E parece que vai aceitar, mas o sentimento de vingança é mais forte e vence: ela escolhe a vingança. E o final do filme já conhecemos, ela fica sozinha e destruída, enquanto a Rainha Branca assume o reino. E tem Alice, a figura central da história, que nos oferece reflexões maravilhosas sobre a vida, sobre assumir quem se é, sobre se amar, sobre se conhecer. Quantas peripécias, quantos perigos, quantas incríveis aventuras ela vive desde que cai naquele "poço da verdade". O que nos remete ao processo de autoconhecimento e autodescoberta que precisamos passar pra começar a viver de maneira mais verdadeira. Viver não é fácil! Penso que é, ao mesmo tempo, maravilhoso e muito dificil. Quer dizer, quando queremos uma vida mais verdadeira. Como dizia Rolf, quando nosso objetivo não é a geladeira nova , um carro do ano platinado e lábios´preenchidos e seios siliconados ( os lábios e os seios são um adendo meu...). A vida verdadeira esconde-se atrás de cada sombra desvelada e desvendada, atrás de cada moita na floresta escura, atrás de cada inferno vivido, compreendido e transformado.Porque a vida é transformação constante. E porque não a possuímos, vida, em toda a sua pujante beleza, nos contentando com migalhas que ficam contentinhas em possuir a "geladeira nova"?( essa é uma pergunta!) Porque dá muito trabalho, exige que despertemos desse bocejo interminável, exige que vamos investigando todos os pequenos temas -(com os grandes temas até caminhamos razoavelmente) - mas os pequenos temas, testes do dia dia, gotículas diárias do bem e do mal - são esses que nos " pegam". Quando incarnamos, trazemos um pedaço da sombra do mundo para transformar. Isso é muito bem explicado pela Patricia Gebrim no seu livro " Gente que mora dentro da gente". Essa é nossa tarefa, transformar essa sombra, trazer a luz que somos, para dentro desse lugar escuro, cheio de bicho-papão, lama e falsidades. A coisa é não nos identificarmos com a sombra que trazemos, senão não temos condição de trabalhar nela, mas, sim, identificá-la. Ao identificá-la, nos desidentificamos. E aí, temos acesso ao trabalho. Nem fazer de conta que ela não existe nem se misturar nela, se casar com ela. " O homem está enamorado da sua prisão", diz Sri Aurobindo. Rumi diz: Porque você permanece na prisão quando a porta está completamente aberta? Tão mais fácil identificar o rabo do outro, criticá-lo, até mesmo querer ajudá-lo, do que encarar a si mesmo,identificar os pontinhos fracos e obscuros da personalidade, perceber até quanto o nosso pequeno ego está atuando em nós... " O mundo se prepara para uma grande mudança", diz a Mãe. E que mudança, amigos, mudança de pato pra ganso, mudança de paradigma, saindo de uma era material para uma era espiritual, sob enorme pressão. Estamos na transição, temos muito trabalho a fazer, incansavelmente. E onde entra a nossa Rainha Vermelha nisso? Ah, sim, a mágoa carregada durante tanto tempo é um dos grandes entraves à transformação. Pode-se ficar uma vida inteira - ou vidas inteiras - atrelado num grão de mágoa, de sentimento de injustiça ( eu não merecia isso...), de visão míope da realidade... Aí, nos carregamos de coragem, como carregamos nosso celular ao fim do dia, pedimos ajuda aos nossos guias e mestres - porque, sozinhos, não conseguimos fazer a coisa, alargamos nosso peito com amor e confiança...e seguimos trabalhando nesse lilah divino. Música e Autoconhecimento! Que música? Hoje sugiro Schumann, seu Papillons op 2, tocado por um pianista bem poético... ,

terça-feira, 28 de março de 2023

E aí, galera? ( reflexões depois de ler a triste notícia do menino de 13 anos...)

Somos bombardeados desde que acordamos até a hora de dormir, com notícias as mais diferentes possíveis.A maioria delas, assustadoramente terríveis, e, pelos entremeios, algumas alvissareiras. Essa é a cara do nosso mundo nesse momento, ou melhor dizendo,a caratonha... Se só virmos a cara, nos assustamos, vamos pra debaixo da cama, ou ensaiamos sorrisos no facebook, tipo "tudo ótimo, galera, olha meu seiosiliconado novo, estou amando loucamente a namoradinha de um amigo meu...ou..."). Mas aí, os mais corajosos, que querem ver além dos sorrisos fakianos ou das caratonhas assustadoras, levantam devagarinho o véu cinzento e multicolorido de Maya e se aventuram a olhar atrás. E o que vêem? - Formas de todos os tipos, emaranhados viscerais enrodilhados, medos cinzentos, tramas urdidas há milênios, sentem sono,sentem um cansaço infinito, sentem medo, sentem cheiros nauseabundos saindo das formas onde eles,os corajosos, também estão enredados.E tambêm vêem aquela árvore que ontem estava mirrada começando a rebrotar, a borboleta esvoaçando alegremente( e que parto difícil ela teve desde quando era lagarta...),os olhos da gatinha,tão amorosos e luminosos,um sentimento de amor permeando toda a dor,um cheiro doce no ar,uma abertura de algo novo na atmosfera, um riso que desce dos céus,um som musical... Toda a vida construída em todas as suas formas trágicas, falsamente, belamente, tudo vai se esvaindo aos poucos numa fumacinha com formato de tijolo, que pode doer na cabeça como uma tijolada mesmo. Cabeça dura, tijolo duro. Aí vamos nós, em mais um dia, desvestindo, revestindo, construindo nesse emaranhado, nesse milkshake às vezes gostoso, às vezes amargo e azedo pra caramba , e a medicina chinesa não diz que precisamos de todos os sabores? Doce, amargo, azedo, salgado, picante... Fico aqui matutando e lembrando dessa criança de 13 anos, com esse corpo de dor tão violento, como diria o sábio Eckhart, aspirando para que não tenha matado a própria alma! E qual a música de hoje? Um mix também: Bach, A Paixão segundo São Matheus; Bach - Marcelo, BWV 974, Adagio, tocado pelo Nelson; Schumann, Cenas Infantis; Matheus Aleluia, Amor Cinza; Gil, Se eu quiser falar com Deus; Japanese Folk Melodies , com Rampal na flauta; e tantas mais... Pode também tocar e dançar um tango argentino, de preferência depois de ter revisto pela enésima vez Al Pacino dançando "aquele" tango no Perfume de Mulher...

sábado, 3 de setembro de 2022

Sobre pandemias de dentro e pandemias de fora

Fico sempre refletindo sobre os últimos anos,os últimos meses... Como estamos nós? O que mudou,o que mexeu,o que insiste em não se renovar,dentro e fora? Início de 2020 ,saio do cinema ,de Parasita,ganhador do Oscar,percebendo a força da semelhança com o momento,me perguntando:onde vai dar tudo isso? O que virá pra nos desalojar desse falso berço esplêndido? Um raio virá, do leste,do oeste,forçando-nos - a nós,humanos - a tomar outro rumo? Um vendaval? Um abraço gigante desse imenso mar? Um tremor inconformado da terra-mãe? No silêncio, como em Melancolía do Lars Von Trier,veio a pandemia, veio o vírus, junto com tudo isso. Ela já estava sendo gestada e ignorada há muito tempo por nós e irrompeu com a força de um gladiador que se lança sobre sua presa,enquanto todos dormiam no acampamento... Gritos,súplicas,desmaios, estupefações, mortes... O mundo inteiro dormia. O mundo começou a balançar. O mundo começou,talvez, a acordar e tirar a remela dos olhos? Claro que com uma incrível piora de tudo, o aumento dos horrores, da fome, das guerras, das falsidades de todo tipo. A tal piora que antecede mudanças importantes. A homeopatia sabe bem disso com os seus "agravamentos", quando o remédio dá certo. Tudo acontecendo à luz do Sol, tudo ficando claro, porque a peneira que tapava o sol, rasgou-se toda, agora tudo está sendo revelado, no passo a passo do dia a dia. 2021 ,2022... Somos nós, alquimistas,que somos chamados a esse despertar, que vamos transformando nosso barro em ouro. Melhor dizendo , com Sri Aurobindo: somos um ferro sendo batido e rebatido pelo grande Ferreiro até aparecer o lingote de ouro puro,o lingote que cada um de nós é, verdadeiramente. Essa é nossa função, nossa tarefa nessa encarnação. E a coisa não acontece na maciota, a coisa mexe nas nossas escuridões, nos nossos esconderijos sombrios, nas nossas imagens laboriosamente construídas com cal... No nosso ego! Vemos a passagem estreita, mas a senha será "transforme seu ego ou não passará". Ego muito grande, passagem muito estreita...fica entalado. Cada um de nós precisa perceber como esse processo acontece em si, porque pra cada um há uma maneira que só funciona pra si mesmo, com os temas da sua própria vida. É difícil e é maravilhosamente abençoado! No ashram onde vivia Mira Mãe, perguntaram a ela " porque o Divino não abolia logo o ego, já que ele é o grande obstrutor" ? Ela responde, rindo : Ah , esse é o nosso trabalho humano. Nunca a noite é tão escura como logo antes da aurora, diz o querido Sri. Seguimos trabalhando, tecendo juntos, com nossas escolhas , essa aurora que se anuncia , em meio a toda escuridão.

Reedição

Esse texto da Coleção Verde e Rosa e a Cruz foi escrito em 2013, há quase 10 anos atrás . Encontrei perdido por aqui pelos rascunhos do meu blog e resolvi editar.

sexta-feira, 2 de setembro de 2022

Coleção verde e rosa e a CRUZ .


Quando meninota e mocinha, lia a coleção verde e a coleção rosa. Adorava ler, vivia lendo, Lobato, Guerra e Paz, livros da biblioteca da minha casa, de pais que gostavam muito dos livros. Não conseguí ler a paixão do meu pai, Euclides da Cunha. Ele tinha tudo dele em casa e os livros eram todos grifados, estudados.
" O sertanejo é antes de tudo um forte" ficou, pra mim, nas primeiras linhas e na força dessa expressão!
Das coleções que mencionei , tinha um livro , " O Rosário", que eu lia e chorava, Nunca entendí muito porquê!Era um amor impossível de Jane e Garth Dalmain, os protagonistas da história. Ele, um pintor, ela, uma moça que se achava feia. E, por causa disso, não acreditou no amor dele, por não se achar merecedora, já que se sentia feia.  Lembro de um trecho marcante, quando ela o deixou:" com os lábios pálidos, Garth beijou a mão de Jane, dizendo baixinho aceito a cruz!" No fim eles se reencontram, ele cego, e terminam vivendo seu grande amor!
Essa história de "aceito a cruz" ficou em mim. Volta e meia, essa lembrança me vinha.
Hoje ela veio novamente e fiquei matutando o porquê dessas palavras me tocarem tanto, até hoje.
O Guia do Pathwork fala da "crucificação do ego" - será isso?
E a lembrança do Cristo na cruz..." Pai, porque me abandonastes?"
E a aceitação do seu calvário, de todo sofrimento, de toda incompreensão e injúria dos homens que ele veio salvar: nós!
Aquela historinha sobre a cruz: " Diz-se que um homem estava carregando sua cruz e, achando ela pesada demais, resolveu passar numa marcenaria e cortar um pouco das pontas. Isso feito, prosseguiu viagem, bem mais leve. Logo adiante, havia um enorme precipício, o chão se abria - e ele viu as outras pessoas colocando cada um sua própria cruz para servir de ponte sobre o vazio, de passagem para o outro lado. Ele tentou, mas faltavam exatamente os pedaços que havia mandado cortar. Por isso não conseguiu passar."

Talvez, hoje, eu esteja tentando achar um marceneiro pra cortar as pontas da minha. 
Tenho a impressão que não vou achar, e ainda bem, porque vou precisar dela inteira pra transformá-la em ponte.
Tudo acontece sempre para o melhor, mesmo que nossa limitada visão não nos ajude a compreender no momento.
Só  me resta ir  para o meu centro, respirando, pedindo ajuda, indo para o coração, sintonizando com ele...
Lembrei da cruz da Nina Simone, do mestre Beethoven, de Bach, de tantos outros tão imensamente maiores que eu que aceitaram as próprias...
OK, Eloisa, vamos ouvir a Paixão Segundo são Matheus hoje!
Somente a música pode ajudar-nos a fazer essa passagem para a aceitação!